Volta às aulas e pandemia: um país perdido.


Em mais um capítulo do lamentável “debate” em torno da reabertura das escolas e agora no pior momento da pandemia, em março de 2021, revela o quanto perdemos tempo e energia em discussões que sequer deveriam acontecer. Se mais de 3600 mortes em 48 horas pela Covid-19 neste início de mês não convencem as “pessoas” pró-abertura de que não há a menor segurança para que alunos, professores, funcionários e gestores voltem a frequentar presencialmente as escolas, nada mais fará.

Tais “pessoas” são desprovidas de qualquer sensibilidade e racionalidade, não vale a pena tentar argumentar fatos e dados com quem compara escola com shopping center e bar. Não existe “saúde mental” (uma justificativa para se atirar a atividades consumistas, nada além disso) e tampouco aprendizagem significativa em um cenário de medo, repleto de restrições e mortes. Escola é interação, é socialização que não atende aos protocolos do “novo normal”.

Aliás, o “argumento” da comparação entre shopping center e bares com escolas demonstra como as redes antissociais, os lugares do senso comum mais rasteiro e que Umberto Eco definiu como plataformas que amplificaram as vozes dos imbecis, influenciam até os chamados “formadores de opinião”. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) determina a frequência obrigatória dos alunos (e professores, obviamente) em 200 dias letivos com carga horária mínima de 800 horas no ano. Se há alguma lei que obrigue o frequentador de bar e shopping a uma frequência parecida nestes estabelecimentos, por favor, eu gostaria de saber. Lugares fechados, com pouca ventilação e muita gente são ideais para a propagação da Covid-19, isso já está mais do que explicado e relembrado o tempo nas grandes mídias e canais de informação.

Não é o momento de discutir reabertura de escolas. O momento pede ações de controle para a transmissão do vírus. Pede o retorno urgente do auxílio emergencial, da testagem em massa, de atualização de protocolos, de mais vacinas e distribuição rápida para cidades e estados. E pede, sobretudo, discursos afinados entre autoridades públicas e influenciadores de todas as esferas para uma comunicação direta e correta para a população.

Mas o que esperar de um país que ama as tais redes a ponto de aplicar como “protocolo de segurança e prevenção contra o coronavírus” a aferição de temperatura pelo pulso, uma das inúmeras fake news que circulam há tempos nestas mídias digitais, sobretudo pelo WhatsApp? Desde o ano passado a OMS (Organização Mundial de Saúde) tem chamado a atenção para o fenômeno da infodemia, ou seja, o excesso de informações sobre um tema que torna a comunicação repleta de ruídos e sujeita a milhares de notícias falsas. Ou o país toma as medidas sérias e eficazes para o combate e transmissão do vírus, inclusive na aquisição de vacinas e um "presidente" que ao menos não atrapalhe, ou não sairemos desta pandemia tão cedo - e, pior, o Brasil já é visto como uma ameaça ao mundo.



Estamos perdendo uma grande chance, isso sim, de discutir e pressionar por uma nova Educação. Um novo sistema de escolarização para um novo tempo, porque não se enganem: a “volta ao normal” é a volta às velhas e antiquadas práticas que temos há décadas nas escolas, com salas superlotadas com 35, 40, 45 alunos espremidos em infraestrutura precária e professores desvalorizados em seus salários e fatigados com uma carga horária insana. Se a palavra mais usada nos últimos tempos tem sido “reinventar”, por que não reinventar o sistema de escolarização? Um sistema cada vez mais burocratizado com práticas de gestão via empresas terceirizadas que imitam o big brother orwelliano visando unicamente notas em provas de avaliação externa, sufocando qualquer potencial criativo seja de professores e de alunos.

A crise sanitária do coronavírus é sobretudo uma crise ambiental, um reflexo de nosso modelo de vida, de consumo, sobre a nossa indiferença ao que acontece em nosso cotidiano. Não é possível que continuemos a banalizar a morte de milhares de pessoas e considerar isso e diversos outros problemas sociais que estamos presenciando nessa pandemia como “algo normal”. A escola precisa tratar sobre estes temas, trazer para o seu interior conceitos e discussões além das decorebas e burocracias inúteis, e não um vírus que já matou mais de 260 mil pessoas no Brasil e tem inviabilizado a reabertura das escolas — Manaus e São Paulo estão aí para demonstrar que, se os governantes teimosamente e irresponsavelmente abrem as unidades, o vírus fecha.

A essa altura já não me iludo. Isso seria o ideal, mas idealizações estão proibidas em um país que perdeu a razão e o rumo há muito tempo. O comportamento da população, em parte, é influenciado pela postura desdenhosa e negativa de lideranças e influenciadores. No país da pior gestão da pandemia em todo o mundo, SOBREVIVER é o maior ato de desobediência civil.

2 comentários:

  1. Teu texto aborda maravilhosamente a nossa realidade.Incrível o que vemos acontecer.Afff...Cada vez mais à deriva estamos... Adorei as ilustrações.Parabéns! abraços, chica

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