Feliz "Natal", ho ho ho!

(Clique na imagem para melhor visualização, ho ho ho!)

O sujeito está vestido com um roupão vermelho, usa um gorro (da mesma cor) enorme na cabeça e para completar a indumentária, a barba branca: “ É um dinheirinho a mais no final do ano, né?”, diz ele, talvez tentando convencer a si mesmo que vestir-se como Papai Noel no Nordeste brasileiro em pleno verão não é uma insanidade.

A linda jovem está subvertendo uma tradição antiga, a dos duendes ajudantes do Papai Noel. Hoje, ela faz parte das “ajudantes natalinas”, aquelas moças responsáveis por organizarem as filas e "domarem" as crianças que querem tirar foto com o bom velhinho. O problema é que ela, linda jovem com uma saia não muito longa que deixa à mostra um belo par de pernas, tem que resistir ao assédio dos papais e irmãos mais velhos que passam todo o tipo de cantada barata e até propõem encontros. “ É um dinheirinho a mais no final do ano”, diz ela, tentando convencer a si mesma que pode suportar tudo aquilo.

A madame empetecada passeia pelos corredores lotados do shopping com um par daqueles gigantescos óculos escuros que quase esconde todo o rosto - e, consequentemente, o olhar. Repleta de balangandãs pelo pescoço e braços, fixa o olhar em uma vitrine e não repara quem está ao lado, à frente, simplesmente avança com a gula consumista que é facilmente confirmada com as sacolas de lojas chiques nas mãos. Entra na loja em um rompante e dá ordens como se a vendedora, uma morena bonita e simpática, fosse sua empregada. A madame faz as suas compras e saca o cartão de crédito. A vendedora, meio sem jeito com o ar imponente da cliente, fala sobre a contribuição para a “caixinha de natal”. A madame responde que não tem trocado e sai da loja com mais uma sacola. “Seria bom um dinheirinho a mais no final do ano”, pensa a vendedora.

O rapagão bombado, correntão de prata no pescoço, cara de malvado e cheio de marra - e nem assim consegue esconder a origem burguesa - sai atropelando a quem encontra pela frente nos corredores. Está impaciente e falando ao celular o tempo todo. Um celular que já não serve para mais nada depois de 6 meses de uso: agora quer um mais moderno, cheio de recursos. Na verdade o que ele quer mesmo é um desses novos brinquedos tecnológicos que agregam desde internet e jogos a livros digitais (embora o rapagão não seja chegado em leitura) em um produto só. Seus olhos brilham ao ver o produto e espera ganhar tal presente. Papai Noel pode escolher: ou deixa o produto junto à árvore de Natal ou dá o cartão de crédito para o garotão escolher o modelo preferido, afinal saiu “um dinheirinho a mais no final do ano”.

E na saída do estacionamento, os motoristas brigam, xingam, fecham entradas e saídas e disputam acirradamente 10 centímetros de espaço ( Freud teria uma explicação sexual para isso?) e das barracas de camelôs é possível escutar uma barafunda de músicas natalinas em diversos ritmos: Simone com “Noite Feliz”, inúmeras versões para "Merry Xmas" do John Lennon e demais hits da época executados no cavaquinho. Os guardas de trânsito da cidade, absolutamente perdidos, movimentam os braços para lá e para cá em gestos que ninguém consegue entender. E sob um sol de 40 graus neste inicio de verão no Nordeste, a decoração natalina com aquele gorducho de barba branca e roupão vermelha deixa qualquer um febril.

Os telejornais de TV falam em “melhor natal de todos os tempos” para o comércio. Surgem imagens de shoppings e centros comerciais absolutamente lotados e as pessoas fazendo malabarismos para comprar e carregar os presentes. A apresentadora sorri, o apresentador fala do percentual de crescimento, a entrevista com o presidente da Associação Comercial é quase eufórica e, nos intervalos comerciais, mais músicas natalinas, produtos, promoções, gorros vermelhos, árvores de natal e Papai Noel. Todo mundo atrás do “dinheirinho a mais no final do ano”.

Até mesmo Jesus Cristo entra nas campanhas publicitárias por intermédio de Padres, Pastores, Bispos e Ministros apelando para o espírito de confraternização para que o fiel dê uma ajuda às obras de igreja ou templo. Afinal, deve ter sobrado “um dinheirinho a mais” no final deste ano.

A verdade é que o dia 25 de Dezembro como nascimento de Jesus foi obra de uma canetada de um Papa, aproveitando a data consagrada ao deus Saturno na velha Roma e, mais tarde, ao Sol “Invicti”. Logo, uma festa paganizada – de paganizar, pagã. “Paganizar” é, segundo o dicionário, é também descristianizar, ou seja, abandonar a fé cristã. Portanto, toda esta correria aos centros de compras, o apreço pelos chamados bens finitos – produtos, presentes, carros, consumo – acaba fazendo sentido.

Mas sou teimoso e gosto de pensar que a data representa algo mais significativo para diversas pessoas. Gosto de lembrar que fui criança e esperava por Papai Noel dormindo perto da árvore de natal. Ainda existe “alguma coisa” que resiste e supera o consumismo, a apelação publicitária e a melancolia. ( a chamada "tristeza de fim de ano" não é coisa rara de acontecer)

Eu sei o que é "essa coisa". E você também deve ter “alguma coisa” por aí. Ou talvez não tenha. Seja lá como for, tenha um Feliz Natal - do modo que você achar melhor!


9 comentários:

  1. Velho, vc descreveu tão bem as tantas cenas que vemos por aí, nos shoppings e comércios da vida, que tive de rir! Aliás, o Natal é isso mesmo: uma festa engraçada. Roupas de Papai-Noel em pleno calor brasileiro, árvores enfeitadas com espuma pra parecer neve, vários desenhos de casinha com chaminés... tudo isso, me faz rir pacas!

    Olha... sou cristão! Acredito em Deus, no Natal, como data para celebrar o nascimento de Cristo, mas, francamente... isso tudo passa muito longe do verdadeiro significado do Natal.

    E pq em 25 de dezembro? Data comercial e - não sabia, até ler o texto todo - e paganizada!! Já ouvi falar que Cristo teria nascido em Março :P

    Enfim, beleza de texto, cara! Valeu pelas risadas e, também, pela reflexão.

    Abraços o/

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  2. Olá!!!

    Você falou uma coisa que sempre senti: PENA dos tiozinhos que fazem esse bico de papai noel.

    Todo ano esses repórteres sem criatividade fazem uma matéria "feliz" sobre os pobres coitados que tem de se fantasiar para tirar um a mais, como se isso fosse uma coisa bacana, prazerosa ,uma tradição!!
    Quem é que gosta disso meu Deus???
    Aposto que todos largariam o bico em troca de contas pagas e uma breja gelada em casa pra matar o calor no meio da tarde!

    Eu gosto das festas de fim de ano porque reúnem a família; o legal é que na minha casa temos a cara de pau de só convidar os parentes legais, então fica sendo muito bacana!

    Boa folga pra você, aproveite e descanse bastante!

    Feliz natal e feliz ano novo!

    Um beijão!!!!

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. Não gosto do Natal e nunca escondi isso. As pessoas esquecem o verdadeiro "espírito de Natal" e o consumismo exacerbado, faz com que esqueçamos quem é o "aniversáriante" e o que foi pregado por ele.
    Não gosto de hipocrisia e os Natais são sempre hipócritas.
    Também acho que o dia 25 de dezembro é uma data totalmente escolhida a dedo e que com os anos passou a ser somente um data comercial... Mas isso não teria a mínima importância se o comemorado fosse amor ao próximo. O aniversáriante ficaria bem mais feliz!!!

    Jaime, Feliz Natal! E se não te ver "on" já aproveito para desejar, um Excelente 2011!!! Se cuide ai pelo Sertão e não me prive muito tempo da sua genialidade!!!

    Beijinhos!!!

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  5. Oi, Groo! Obrigada pelo recadinho lá no blog! Vim te desejar tudo o que me desejou e em dobro, e que você continue sendo essa pessoa bacana que é.
    Não pude ler seu post agora, pois estou de saída, vou ali "ceiar" rapidinho e já volto... (rs)
    Vim mesmo só te desejar um feliz Natal e que Deus ilumine sempre a sua vida!

    Abração!

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  6. Aproveite pra descansar e até daqui a pouco. ;)

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  7. Olá, professor!

    Às vezes é estranho, mas conforme o tempo passa, o significado das coisas mudam. Não seria diferente com o natal (se é q ele não foi sempre uma data consumista, há quem diga q Jesus "nasceu nesse dia" só pra ganhar presente, desbancando todos os deuses solares "nascidos" na mesma data).
    Brincadeiras (estúpidas) à parte, o tal do "espírito natalino" ainda incorpora por aí. Veja só quantas pessoas enxergam essa data como (única) oportunidade (?) de reunir a família. Eu conheço, pelo menos, uma dúzia delas.
    O consumismo é o q fizemos de nós, nessa em em tantas outras datas simbólicas.

    Enfim, aproveite as férias!

    bjohnny!

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  8. Mermão, os comentários acima já falaram muito bem de sua crônica. Uma das melhores que já li, contando também a de grandes cronistas. Parece que vi o curtametragem (é com hífen ainda?). E há esta "alguma coisa", sim, há este espírito que vence as paganices do cristianismo.

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