A EDUCAÇÃO, OS PROFESSORES E OS "ESPECIALISTAS"

Havia dois assuntos para escolher e postar no blog:ou sobre a generosa ajuda que o governo vai dar para times de futebol através da TIMEMANIA ou sobre a polêmica entre a Igreja Universal e a Folha de S.Paulo.

Mas peço desculpas aos meus 3 ou 4 leitores ( ta aumentando!) para tratar sobre educação e, mais especificamente, sobre os “especialistas” em educação da “revista” VEJA ( aspas necessárias). O texto é longo, inadequado para um blog, mas não pude deter os dedos. Peço desculpas por isso também.

A citada “revista” tem entre seus colunistas os chamados especialistas em educação: o economista Gustavo Ioschpe e o também economista Cláudio de Moura Castro. Que tem seus títulos, claro. Mas o termo especialistas será utilizado entre aspas. São necessárias: ambos analisam a educação baseados em estatísticas e dados de pesquisas e institutos sob a máxima “os números não mentem” - mas disfarçam muito bem!

Para o “especialista” Gustavo Ioschpe, o professor da rede pública de ensino reclama de barriga cheia. As escolas oferecem infra-estrutura adequada, as cargas horárias não são pesadas, a violência atinge níveis insignificantes, as salas não estão superlotadas e, é claro, o salário é compatível com a função que desempenham.

O colunista traz estatísticas, dados, informações oficiais e tira conclusões que desafiam a lógica do bom senso. É inacreditável que um profissional que se diz “especialista em educação” tenha a coragem em dizer que os professores não trabalham em condições sofríveis porque 87% das unidades escolares no Brasil possuem energia elétrica e 90% possuem banheiros, água encanada e esgoto.

Acontece que uma escola não é feita só de lâmpadas, canos e vasos sanitários. Quando se fala infra-estrutura básica, isso abrange vários pontos: desde o tamanho das salas para turmas grandes, a acústica destas mesmas salas, as condições estruturais dos prédios, quadros, espaços para recreação dos alunos, para os professores, atividades para teatro, dança...curiosamente o “especialista” não se refere aos materiais utilizados pelos professores e alunos ( papel, tinta, livros, uniformes, etc), mas citou que 42% das escolas do país possui computadores.

É um dado interessante e confunde o leitor um tanto desatento ou que desconhece a rotina escolar. Afinal, como os professores poderiam reclamar da falta de material se quase a metade das escolas possui computadores? Aí retomamos a questão dos “números não mentem, mas disfarçam muito bem”.

Qual a situação destes computadores? Como são utilizados? Os professores da unidade escolar possuem formação para lidar com as máquinas pedagogicamente? Há manutenção constante? Os alunos tem acesso? Como trabalhar com 10 computadores em uma sala com 30 alunos e sem apoio?

Reparem quantas perguntas e, ao passarmos pelo funil, descobrimos que os 42% de PC’s não resistem ao choque da realidade confrontado com a frieza das estatísticas. Mas para o “especialista” Ioschpe, tais questionamentos não são relevantes. As escolas do Brasil estão bem estruturadas ( tem água e luz) e a culpa pela qualidade ruim do ensino é do professor.

Que ganha mal. O outro “especialista" em educação da “revista VEJA”, Cláudio de Moura Castro, afirma que “a má qualidade do ensino não pode ser explicada pelos salários dos professores”. E ainda desafia: quem discorda, que demonstre que os números ( sempre eles) de seu levantamento com Gustavo Ioschpe estão errados.

Pois bem: um professor com licenciatura no estado da Bahia tem vencimentos por volta de R$ 491 em 20h/aula.Se não for iniciante na rede há várias gratificações ( lembrando que gratificação não é salário, pois ao aposentar o professor perde todas as vantagens que conseguiu ao longo dos anos) que engordam a renda para aproximados mil reais, mas com os descontos, o professor recebe por 20 horas/aula algo em torno de R$ 800 ( isso se tiver alguns anos de serviço, que contam nas gratificações).

Para obter-se uma renda média mensal ao menos aceitável, tal professor precisa no mínimo trabalhar 40 horas/aula para dobrar este salário. Se o professor tiver família, filhos e financiar a casa própria, terá que trabalhar 60 ho/aula para conseguir honrar seus compromissos e ter uma renda razoável.

Pergunto aos meus 3 ou 4 leitores ou quem mais ler: um professor que trabalhe 60 h/aula por semana ( os 3 turnos – manhã, tarde e noite) pulando de uma escola para outra terá condições de planejar aulas atraentes e dinâmicas nos 200 dias de ano letivo? Este professor chegará em casa ao final do seu dia de trabalho ( que começa às 7:30 da manhã e termina às 22:00 nas escolas) com ânimo para preparar aulas diferentes, corrigir provas e trabalhos e dar atenção à família?

Não parece óbvio que se o professor ganhasse melhor e tivesse uma carga horária adequada para aulas ( e não a loucura das 60h/aula) ,planejamento de atividades e cursos de formação continuada a qualidade do ensino não melhoraria? Mas os “especialistas” preferem generalizar os professores como “aproveitadores das brechas de regulamentação frouxa” – tática interessante: tomam um dado como o que 13% dos professores de SP faltam diariamente, focalizam em tal informação, amplificam e generalizam a todos os profissionais de educação. Ë evidente que há maus professores e estes devem sofrer as sanções cabíveis, mas os professores são, de modo geral, comprometidos com o seu trabalho.

Por mais que tais “especialistas” em educação mostrem dados, estatísticas e a partir deles tirem suas conclusões precipitadas e sem qualquer embasamento de campo, o Brasil não é a Finlândia (fetiche dos “especialistas”) e o descaso para com a educação é histórico e vergonhoso – como em outras áreas como saúde e meio ambiente, por exemplo.
Mascarar a realidade que a maioria dos professores da rede pública enfrenta através de dados e mais dados além de estatísticas não é só uma atitude desonesta – é também culpabilizar exclusivamente a categoria que vem sustentando sozinha há décadas uma educação órfã de Estado e família.

LEIA TAMBÉM: Excelente artigo do professor Gabriel Perissé publicado no OBSERVATÓRIO DA IMPRENSA.

ESTA SALA DE AULA NÃO É NO BRASIL ( segundo os "especialistas")

( tá tosco porque é um desenho antigo...rsss)

11 comentários:

  1. Sou professor e casado com uma profesora, e possso garanti que nas escolas particulares os salários são pésimos, a carga horária é alta e tudo mais. Mas realmente o professor de escola pública não tem condições de trabalho, e em alguns estados recebem pouco mesmo. Mas esses especialistas são muito "tapados" eles se baseiam em numeros dos governos.

    gostei do blog, é bem informativo e bem escrito os textos.

    abraço

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  2. Jaimão,

    Apenas um comentário: "Tinha que ser a Veja !"

    São projetos de "Diogo Mainardi" tentando aparecer ou então simplesmente são matérias encomendadas, seguindo a linha editorial da "revista". Note as aspas, porque se elas couberam no caso dos "especialistas", também cabem ao citar esse veículo, que está mais pra folhetim tucano do que qualquer outra coisa.

    PS.: Acho o PT e os Tucanos tudo farinha do mesmo saco. Digo isso porque criticar tucano nesse país virou sinônimo de apoiar o PT, o que não é meu caso.

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  3. Valeu, Allan, pela visita e pelo comentário! Acho que os partidos políticos brasileiros, no fundo, são todos iguais.

    Mas sabe qual é a razão destes ataques tucanos ao professorado? Os níveis da educação em SP estão péssimos; Como o governo tucano adora um marketing bem-feito, resolveram atacar - através de seus folhetins VEJA E FSP - justamente a classe mais enfraquecida: os professores são os culpados, e não a falta de investimentos, políticas educacionais fracassadas, etc.

    Pior é que tem quem caia neste discurso todo...

    abs!

    PS: Não sou PT, PMDB, PCdoB,PDT,PSOL, nada dessas coisas aí...sou santista! uhauhauhaa!

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  4. Cara esses especialistas devem viver em outro país, ou então eles não saem de casa, devem escrever essas matérias no conforto dos seus lares em bairros nobres.

    Quantos absursos!!!!!Dizer que o professor ganha bem é o maior deles. ELE SÓ PODE SER CEGO!

    já que eles se dizem especialistas eles deviam saber que estatísticas nem sempre condizem com a realidade, não é pq uma escola tem computadores que os alunos têm acesso a eles, às vezes não Têm nem caderno pra escrever e carteiras decentes pra se sentar.

    AFF...

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  5. Vou te dizer: ser professor é pra se LASCAR!!! Vou repetir o q já cansei, eu sou professora e tô cheia de abrigar em minha função as de médica, psicóloga, juíza, conciliadora... e fazer o papel da "família" que nem existe mais. Chegam alunos piolhentos, cheios de micoses, de unhas porcas, palavreado podre, soltando cada pum horroroso, dentes amarelos, catingando a xixi... EITA!!! Convivendo com tudo isso e tentando sensibilizá-los para conteúdos que na prática da vida deles serão pouquíssimo usados aí descambamos para uma educação desviada do nosso real papel e pagamos o pato por esses índices aí que ratificam nossa "incompetência". EU MEREÇO! Um aluno de 10 anos da minha escola foi reclamado por uma funcionária e agarrou na blusa ameaçando deixá-la nua, tentou fugir e encontrou no jardim a tesoura de poda, pegou e quando foi pedido que largasse disse q se alguém se aproximasse diria a mãe que foi cortado, isso com a mão na lâmina bem afiada. Lembro q ano passado pedi para q descesse do muro e ele me xingou de todos os nomes horrendos q vc possa imaginar, coitadinha de minha mãe e de meus poros. É apenas um caso. Sinceramente amigo, eu não quero daqui a pouco tempo estar andando sob efeito de tranquilizante feito algumas professoras conhecidas. Quero mesmo é ser valorizada em amplo aspecto, hj sei que isso depende exclusivamente de mim,do que faço para conquistar, sou de luta. Minha postura aprendida na porrada é ser apenas professora e deixar de querer salvar o mundo. Realizo bem meu papel e ponto. Desafio esses especialistas a darem uma horinha de aula pro nossos alunos e saírem com esses conceitos e com a cara descansada. Eles vão comprar é um carretão de pílulas azuis. Com essa vou. FUUUI. Um abração meu mestre.

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  6. Então, muito bem usada as aspas em tudo! Detesto pseudo qualquer coisa, não suporto, além de tal "revista" ser mais marrom que a Contigo e mais desnecessária.

    Vida de professor... vc disse tudo e mais um pouco, está incontestável e absolutamente bem escrito.

    Sabemos onde o país vai chegar. Sem educação, a lugar nenhum.

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  7. Olá!
    Em primeiro obrigada pelo elogio ao post no meu Blog!

    Em segundo vou contar um fato que está acontecendo aqui no meu estado nos meios da Educação e Saúde. Bom eu moro em Porto Alegre e a "nossa" governadora Yeda está, para pagar dívidas e outras coisas mais, cortando gastos. Porém ela está cortando gastos da educação e saúde, mas que gastos? Se os dois departamentos simplesmente não recebem nada.
    Bom o que posso falar mesmo é na educação: ela está diminuindo turmas, ou seja, querendo colocar duas turmas de até uns 20, 25 alunos numa mesma sala...ou seja, no fim de um período de aula o professor,com a bagunça a desordem, ainda estaria fazendo a chamada!
    Assim, diminuirim professora,(mais professores desempregados) menos estudo, pois seria empossível dar aula pra 50 alunos!

    Vamos ver, isso já tá rolando, tem escolas que já fecharam outros se me lembro bem de Públicas passaram a Municipal, quero ver até onde vai!

    Beijos:P

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  8. Esses "especialistas" só vêem o que os leitores da citada "revista" querem ler.

    Não é de hoje que existem problemas na educação e ainda assim insistem em tratar as conseqüências do problema, não a causa (como as cotas em universidades, por exemplo).

    Ótimo texto.

    beijos
    www.outroblogdamary.com

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  9. People should read this.

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  10. Texto muito bom, porém creio que nós, professores/as da ativa e aposentados/as, "deixamos" que alguns "especialistas" falem por nós. E, cada vez mais, eles vendem seus artigos, aparecem na mídia, fundam programas. Os sem-tempo, porque trabalhadores, ficam nas salas de aula 9 horas ou mais por dia. Às vezes nem leem o que os "especialistas" (copio suas aspas) que nunca entraram em salas de aula escrevem. Enquanto artigos ridículos transitam pelo Brasil os/as mestres/as da vida real sofrem diante das consequências e inconsequências de tais textos.
    P.S. Gostei muito das tirinhas.

    Modesta Trindade Theodoro
    http://blogdamodesta.zip.net

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  11. Sou professora, mas me recuso a dar aulas em escolas. Trabalho com adultos e sou professora particular.

    Só eu sei o que passei no único período em que trabalhei numa escola, durante meu estágio obrigatório.

    Nunca mais quero passar por isso.

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