Sobre o suicídio

(Desta vez, não tem charge infame. Fica para outra vez. Fiquem com um artista de verdade: Edward Munch)

Não conhecia Cibele Dorsa. Na verdade, nunca ouvi falar nesta atriz, modelo e apresentadora até que seu nome e fotos figurassem entre as principais notícias nos sites, jornais e telejornais. Infelizmente, não por algum trabalho ou programa de TV, e sim por um trágico suicídio.

O suicídio...tema pesado e desagradável. O escritor Albert Camus, autor de O Estrangeiro (recomendo!), já se referia ao suicídio como “ a grande questão filosófica de nosso tempo”. E continua: “decidir se a vida merece ou não ser vivida é responder a uma pergunta fundamental da filosofia.". Dante Alighieri dedicou um dos círculos do inferno em sua Comédia para os suicidas – que são transformados em árvores que esvaem em sangue quando as Harpias pousam e usam suas garras – e os cristãos condenam o ato.

Para muitas pessoas, o ato do suicídio trata-se de uma covardia ou egoísmo; para tantas outras, é um ato corajoso. Independente da natureza ou motivação do ato, o suicídio é um problema de saúde publica, segundo a OMS – Organização Mundial de Saúde. Atualmente mais de 1 milhão de pessoas cometem suicídio, por ano.

O que leva alguém ao suicídio? Sem esquecer das patologias e da depressão, há várias motivações. Muitas incompreensíveis se observadas em primeiro plano ou de forma apenas superficial. É o que faz muitas pessoas questionarem, no caso da Cibele Dorsa, por que uma mulher “jovem, bonita, com alguma fama e dinheiro, que tem tudo” faria isso. Para o filósofo francês André Comte-Sponville, “não é a vida que se recusa, é a velhice, é a solidão, é a escravidão da doença ou da miséria, os sofrimentos da deficiência ou da agonia”. É por isso que o fato de ser “jovem, bonita, famosa, rica” não implica necessariamente em uma vida feliz.

Confunde-se, novamente e como sempre, a felicidade aos bens materiais e padrões de consumo. Que alguém pode encontrar momentos de felicidade com isso, sem dúvida – se eu ganhasse na mega sena acumulada, certamente faria bom proveito com algumas benesses que o dinheiro pode proporcionar; no entanto, isso não livra da agonia, da falta de esperança, da tristeza. Novamente, dou a palavra ao filósofo francês: “só podemos usar duas coisas contra o sofrimento e a infelicidade: a aceitação e o combate”.

Parece duro? Sim, pois vivemos no mito do “felizes para sempre”, o que não existe. Desculpem se pareço ácido ou meu tom não é otimista. O que existe é a vida com todas as suas complexidades, com suas felicidades e infelicidades, e aceitar isso é o primeiro passo, seguindo por encontrar meios para combater o sofrimento e o principal de tudo: amar a vida. Quando isso é vencido, entra-se em processo de melancolia, depressão. O que pode levar ao suicídio.

Covardia ou coragem? Aí retomo a citação de Camus logo no começo deste texto. Creio que não cabe a nós julgarmos o suicídio como covardia ou coragem. Trata-se de uma escolha, cada pessoa é o seu próprio juiz. No entanto, se nós pudermos ajudar de alguma forma ao potencial suicida – há sinais - retomar o gosto pela vida, façamos. Uma simples manifestação de carinho ou amizade, um ombro para apoiar e ouvidos para escutar...talvez o que tenha faltado para a atriz. Talvez o que esteja faltando para muitos, em uma época em que o descartável e a indiferença começam a predominar.

12 comentários:

  1. Esta sua última frase é lapidar, Jaime, " época em que o descartável e a indiferença começam a predominar". Você me fez lembrar de Durkhein, que tratou do tema. Apesar do foco religioso, comparando indices entre católicos e protestantes, que não vem ao caso aqui na modernidade, o que ele aborda acerca da motivação pela falta de integração do sujeito na sociedade, vai ao encontro de sua reflexão aqui tão bem esclarecida. Quanto mais desintegramos socialmente (e isso inclui indiferença e materialismo exacerbado) mais se acentuam as patologias, dentre elas o extremo que é o suicídio. Abraço grande,mestre! Paz e bem.

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  2. Eu conhecia a Cibele e adorava as coisas que ela vivia escrevendo no facebook... quando soube do seu suicídio neste fds fiquei muuuito triste!!
    Também acho que foi a solidão; ela deixou uma carta de despedida muito triste!!

    Tenho um ex que se matou, e quando eu soube já estávamos separados fazia 2anos. Fiquei com um buraco dentro de mim e com raiva por ele ter feito isso pra família dele.
    Acho que os suicidas são o desespero na sua essência.

    Beijos!!

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  3. Gostei do seu Blog. Também gosto de desenhar se puder ver o meu também acho que vai gostar... www.desenhadinho.com

    vou te seguir pra acompanhar seu trabalho.. abraço

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  4. Querido amigo, muito verdadeiras as suas reflexões acerca do suicídio, principalmente com relação à atualidade. Penso como vc, que não devemos julgar; não consigo chegar a uma opinião, se é covardia ou coragem, mas de uma coisa eu tenho certeza: é a solidão e a tristeza falando mais alto. Beijos, sua fã número 1 !!! Lê

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  5. Difícil, pra mim, que carrego a chamada culpa católica, falar do tema.
    Sem chegar a uma conclusão, ou mesmo, sem esboçar alguma opinião que ajude a concluir algo, ouso dizer que a reflexão é válida.

    Merecedora, talvez, se não de mais debates, de mais e mais reflexões.

    Não sei dizer.

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  6. Vou ser breve e possivelmente babaca.
    Suicida não é somente quem comete o ato, mas também quem pensa no mesmo.

    Alguns suicidas se matam sem motivo algum além de não querer mais viver.

    Belo texto, Groo.

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  7. Eu ia devaneiar sobre os vários suicídios na UERJ (os casos são sempre abafados).
    Há uns dois anos um vizinho se suicidou. Leu algo em sua bíblia, subiu numa cadeira, colocou uma corda no pescoço e pulou.
    Todo o bairro ficou chocado. Aparentemente não tinha inimigos, não tinha dívidas, família unida, condições financeiras razoáveis, as pessoas gostavam dele (não o conhecia direito mas era um sujeito prestativo). E você pensa: por que um cara desses se mata?
    Outro dia li em algum lugar da internêta que o suicida está exercendo um direito seu, o de acabar com a vida que lhe pertence. E, se pensarmos dessa forma, o suicida era um corajoso, alguém que desafiou o instinto de sobrevivência e lidou com o fim. Mas será que a nossa vida pertence somente a nós mesmos? O suicida tem família, amigos, pessoas que se importam com ele. Nesse caso ele não acabou com algo que pertencia somente a ele, o ato interfere na vida de outras pessoas, é inconsequente.

    Seja como for, é complicado.

    bjohnny!

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  8. Obrigada pelo seu comentário carinhoso! B*s!

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  9. O fracasso pessoal e profissional também potencializa o suicídio (que leva à depressão, o que já é meio caminho andado). Peguemos o Japão, por exemplo. Na cultura deles, muitos dos casos de suicídio são causados por japoneses que se sentiam pessoas fracassadas, incapazes, indignas a viver. Coisa parecida acontece na França também.

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  10. Olá!!!
    Nossa, as histórias das suas alunas são realmente demais!
    Morri de pena da que era prisioneira do marido!
    Acho que ser professor é uma responsa tão grande, e é tão bonito, tão necessário!
    Parabéns, graças a pessoas como você o mundo se torna um lugar melhor!!!

    beijos!!!

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  11. Jaime....suicidas escancaram, concluem....

    Nem entro no mérito do ato, por ser extremo e por me fugir à compreensão...

    E os suicidas que ainda andam entre nós ? Já se mataram e não sabem....esses merecem uma reflexão realmente humanista

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  12. Quem não pensou no suicídio, pelo menos por átimos, não viveu. Um artigo que se aproximou muito do que penso e, mais interessante, dos autores que falaram sobre o suicídio. Quando comecei a ler, e veio Camus, eu falei, "ele vai mandar a do Dante". A linha de Sponville se liga tb a Baruch de Espinosa e a Pierre Legendre, acho até que a aceitação do sofrimento que nos faz viver, ele deve ter tirado do Legendre, não sei. Um de sus melhores artigos!! Ah, sem contar a obra de Edvard Munch, que enriqueceu a (sua) obra.

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