A ignorância pode ser uma bênção


Essa história aconteceu há algum tempo. Eu estava em companhia de algumas pessoas visitando o Museu de Arte Moderna de Salvador (o belíssimo Solar do Unhão) e aproveitando uma tarde ensolarada na Baía de Todos os Santos. Caminhávamos em direção ao parque das esculturas quando  vi uma equipe de TV se preparando para gravação e havia uma bela morena que trocou olhares e sorrisos com alguns de nosso grupo. 

- Ela é linda e muito simpática, não é? - comentou um rapaz que estava conosco. 
- Quem é aquela moça? Você conhece? - perguntei, com toda a ingenuidade do mundo, o que gerou risadas do grupo.
- Aquela é Fulana de Tal, cantora! Nunca ouviu aquela música “pá-pá-pá...”? - explicou uma colega e começou a cantarolar uma música da qual eu desconhecia, apesar de todos no pequeno grupo jurarem ser um sucesso. 
- Nunca ouvi essa música, sério. - murmurei, tentando lembrar a música ou buscando na memória alguma lembrança da sonoridade, mas sem êxito. Eu realmente não conhecia.
- Ah, não acredito! Em que mundo você vive? - retrucou a colega. 

Certamente não é no mundo das celebridades e das subcelebridades. Eu não sei o que estou perdendo em não acompanhar com afinco as últimas novidades sobre o artista X ou a cantora Y e principalmente sobre os eliminados no paredão do Big Brother Brasil, mas basta uma navegada pelos portais de notícias na internet e não é difícil encontrar notícias – ou melhor, fofocas – sobre a vida dos “famosos”. 

Repare que coloquei a palavra “famosos” entre aspas porque parece ser mais conveniente. Vejo fotos e leio notícias de algumas pessoas elevadas ao hall da fama e procuro alguma coisa que as identifiquem – ator, atriz, cantor, cantora, escritor, político; mas não raramente encontro que Fulano é “ex-BBB”, Sicrana é “ex-namorada de jogador de futebol” e ainda há quem seja “promoter” ou “empresário”. A coisa piora quando procuro pelas habilidades de alguns destes “famosos” – e pelo visto o talento não é mais um traço de distinção.   

Na era da visibilidade e narcisismo levados ao extremo através das redes sociais e compartilhamento de vídeos, parece que não é tão difícil ser “famoso”. De repente um cantor da Coreia do Sul torna-se sucesso mundial através de um vídeo no youtube em que ele inventa uma dança desengonçada – e o próprio cantor admitiu que tentou fazer tudo o mais ridículo possível. Deu tão certo que o sujeito veio parar no carnaval brasileiro, virou destaque em trio elétrico (!) e embolsou a módica quantia de R$ 1,5 milhão. Uma brasileira que morava no Canadá também experimentou seus momentos de fama graças a um simples comercial no qual ela é apenas mencionada e virou sucesso na internet. Os exemplos são vários.  

Alguém pode dizer que não é tão diferente das revistas de fofocas e das “colunas sociais” nos jornais, povoadas de celebridades das quais nunca ouvimos falar. E é verdade, embora o alcance das novas mídias seja maior e o “sucesso” de certa forma seja bem mais efêmero. Obviamente a democratização da informação e compartilhamento de conteúdos são maravilhas de nosso tempo e ao lado de tantas figuras inexpressivas que são alçadas à fama através de “likes” e “Rts” nas redes sociais, temos também muita gente boa e talentosa fazendo coisas incríveis e divulgando pela internet. 

Oscar Wilde observou que “para ser popular, é indispensável ser medíocre”-  certamente um exagero do dândi, afinal popular não significa necessariamente mediocridade; porém, se para Sócrates, Buda e tantos outros sábios a ignorância é causa de todos os males, em certos casos relacionados aos assuntos sobre “famosos” a ignorância pode ser uma benção. 

25 comentários:

  1. 'Oscar Wilde observou que “para ser popular, é indispensável ser medíocre” '
    Assim, concordo com vc que ele estava erradíssimo ao confabular tal pensamento... Acho que vc viu a Gaby Amarantos e ela é fantastica, popular e linda!
    Mas concordo com a ideia da postagem. Detesto os famosos fugazes.

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    1. Não foi a Gaby Amarantos, Denise; foi uma cantora de axé music que fazia muito sucesso na época - e tanto "sucesso" que eu nem lembro mais do nome dela rs

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  2. Jaiminho, que tri!
    Tempos de pouco tempo,
    Se não comento,
    sem tempo,
    ...
    esse tempo!

    Amigo entende
    paciente minha sina,
    nunca fui celebridade,
    trabalho,
    trabalho muito,
    não há na minha agenda
    compromisso maior com a fama,
    pois aqui quem fala
    é apenas a Ana,
    do sul do país,
    dessa cidade.

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  3. Olá, Jaime.
    Eu também não faço ideia de quem seja nem como seja um "sucesso" contemporâneo chamado "lek-lek" e me dou muito por satisfeito por isso (este é o tipo de ignorância que vale a pena).
    Também nunca assisti nem acho graça nenhuma no Gangman Style e realmente não consigo entender o porque daquilo fazer sucesso.
    Me parece que nestes tempos de fama (e esquecimento) instantânea, qualquer coisa capaz de agradar um grande número de pessoas ganha status de famosa, e isso não quer dizer absolutamente nada em termos qualitativos e/ou significativos, é a fama gratuita e sem sentido.
    Creio que devemos curtir aquilo que gostamos e sabemos que devemos vir a gostar, sem nos importarmos com a fama de quem a produz, e sim com a qualidade.
    Abraço.

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    1. Eu também não consigo entender como o tal Gangnan Style fez tanto sucesso, Jacques. Mas é isso: curtir o que gostamos independente dos modismos que vêm e vão! Abraço!

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  4. Divulguei lá no face, meu grande parceiro literário!
    Beijos!

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    1. Muitíssimo obrigado mesmo, Cissinha! :) Muito honrado!

      Bjs!

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  5. Cada qual com os seus gostos e preferências. Contudo, quanto mais a mídia jorra informações e acensões baseadas em fatos corriqueiros e sem relevância cultural ou moral, mas popularmente de fácil digestão e aceitação, eu me vejo num mundo paralelo. Difícil fazer parte de tanta futilidade. Mas estão aí, ao nosso redor e a qualquer momento. Beijos.

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    1. São os modismos, né, Ana Lúcia? Eles vêm e vão, sempre há público para estes movimentos. Beijos!

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  6. A minha ignorância televisiva é impressionante.
    Mas olha... acho que sou feliz assim ;)

    Beijos.

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    1. Ah, eu também sou feliz assim, Helena! :) Beijos e obrigado!

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  7. Concordo em gênero, número e degrau, poeta Satoru! =D

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  8. Eu tenho profunda dó dessas pseudo celebridades.
    A mídia suga,suga,suga e depois joga fora.Principalmente,se tratando de ex BBBs.E depois,que os 15 minutos de fama se passam,não sabem o que fazer da vida,muitos caem até em depressão.Vai da euforia a total tristeza.
    Vivemos no país do 'pão e circo' e,enquanto for lucro para alguns,a ignorância superar a Educação e,consequentemente,podar a Cultura nesse país,ela continuará sendo uma benção.

    Beijão,Jaime!Dani.

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    1. Ou então tentam se manter em evidência de qualquer maneira, Dani. :( Beijão e obrigado! :)

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  9. Semestre passado, na disciplina de filosofia, minha professora passou um texto do filósofo francês Luc Ferry "O que é uma vida bem-sucedida", explicando a diferença disto e de uma vida boa. A vida bem-sucedida refere-se à performance, em querer aparecer, se autoafirmar, preencher vazios. Já a vida boa é viver bem, livre de conceitos de sucesso e fracasso.

    Penso que temos tantas subcelebridades como um reflexo dessa sociedade performática que é a nossa. É aquela necessidade de "esfregar a vitória" da cara das pessoas, sentir-se desejado e admirado, sentir-se amado, ou seja, preencher vazios e demonstrar, mesmo que sem consciência disso, de que a pessoa condiciona a própria felicidade ou os rumos que toma dependendo do aval do outro e do que é conceituado como "sucesso".

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    1. Já li algo de Luc Ferry, Peterson. É muito interessante. Sim, essa leitura do francês me lembra - um pouco - os estoicos (principalmente Sêneca) sobre a vida. ( longa, bem sucedida, caráter, etc)

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  10. A cultura popular principalmente criada pelos jovens junto com o século 2000 e o auto grau de 'humor', creio que tem feito o processo que a TV demora séculos pra conseguir: implantar a ideia de que o que é feito de forma medíocre e mais idiota possível, de tão ruim, chega a ser bom. Nunca as vídeo-cacetadas (Faustão) tiveram tanta repercussão quanto compiladas em um único site e reprisadas nos demais canais de TV. Hoje a bola da vez é ser do povo, a mídia diz que traz o povo para a TV e o povo diz que a mídia traz o que não tinha para o povo, mais ou menos como acontece com as notícias sensacionalistas de furtos e roubos (que passaram a ter depois que a mídia divulgou, mas a mídia fala que sempre existiu e só divulgou pois é verídico). Enfim, também sou desses que não faço questão 'estar na moda'. Muito bom o artigo.

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    1. Obrigado, Rafael. E isso tudo que você comentou reflete no modelo de ascensão social no país: o "sucesso" é aparecer na TV e assim "estabelecer contatos", no caso destas subcelebridades com seus 15 minutos de fama. São "guerreiros"... :/

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  11. Você é popular.
    :P
    Viu só quantos comentários?
    Eu gosto também daquele seu lado B, sem população.
    Cadê ele? Esperando.
    ;)

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  12. Concordo plenamente, Jaimezinho... estou com vc e ainda lanço um "é o famoso quem?"(como diz o eterno trolador, Silvio Santos). Esses sucessos relâmpagos cada vez se tornam mais frequentes e "mais relâmpagos que nunca". Sem contar com a futilidade sem tamanho que aparece por aí. Sabe o que é pior? Que muitas vezes não conseguimos ficar longe das "febres do momento". Comigo aconteceu com o tal do Lek lek lek. Depois de séculos, infelizmente chegou o dia em que por acaso eu ouvi essa porcaria. E a qualidade está se tornando item de luxo, uma verdadeira raridade, meu querido! Assim caminha... O.o

    bjks JoicySorciere => CLIQUE => Blog Umas e outras...

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    1. Ô, Joicy, eu sou feliz porque nem sei do que se trata esse "lek, lek, lek" e tampouco o que é o tal "Camaro Amarelo". É uma beleza a ignorância neste aspecto... ;)

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  13. Jaiminho,

    Tudo bem? Sabe que fui lendo o texto e lembrando do filme as vantagens de ser invisível. As vezes o anonimato é melhor que estrelato por vários motivos, inclusive para não ter que pagar terapia. Essa neura de ser Ex-BBB é mais uma trapaça do destino que leva a um caminho completamente solitário. Fiquei pensando também no chorão que morreu não por falta de fama, mas por falta de si mesmo.

    Beijos e beijos.

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    1. Luluzinha, tudo bem. Sabe, eu acho que há pessoas que fazem tanto pela fama e pelo estrelato que desenvolvem até outra personalidade e acabam se perdendo de vez, né? Beijos! =*

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